Masturbação.
Ok, eu sei. Você viu o título e o
subtítulo e pensou sobre uma crítica comum ao filme sobre o criador da Apple
Inc., que estreou esse final-de-semana, não o culpo. Mas, já que você está aqui
persistindo em ler este texto, vamos ser claros: como este filme estreia no
chamado Dia do Sexo, não é de se
surpreender que o filme estrelado por Ashton Kutcher tenha tantas semelhanças
com a nossa conhecida “bronha”. Se você ainda teima em não acreditar – mas persiste
em ler – sente-se aí que a explicação é simples:
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O rei dos fast-foods, Steve Bobs. (Reprodução) |
Como a masturbação, o filme Jobs é para ser visto mais quando você
não têm mais alternativas para fazer. Na sala meio-cheia que acompanhamos o
filme, muitos ouviam músicas em celulares de tela sensível ao toque. A Steve,
eles devem dupla reverência. Como estamos imersos num universo dominado pela
Apple, com bugigangas e mais bugigangas com uma maçã mordida – mas que podem
chegar a custar mais que uma tonelada da fruta – o filme surge como uma
alternativa de visão do gênio inventor da série “i” e de um monte de
tranqueiras bonitinhas que te dão mais status
social do que algo útil na sua vida.
A segunda semelhança é que, tanto na
produção quanto no “ato”, depois de algum tempo a magia passa e a coisa vai é
ficando maçante pra cassete. O filme começa em 2001, com um personagem-título
que apresenta sua (mais nova) obra-prima: o iPod, tocador de música que
revolucionou toda diversos setores da indústria tecnológica e musical. A partir
daí a narrativa volta a partir de 1975, contando o nascimento de sua principal
empresa - já que ele fundou a NeXT Computer nos anos 90, que quase não é
citada. Com 2 horas e 7 minutos, o filme se alonga em uma história que, por ser
genérica demais, caberia em uma hora e meia ou menos.
A terceira e principal característica
que pode unir o filme ao nosso assunto “onanismo” é que ambos baseiam-se em
fantasias da vida real. Olha só: tem gente que fecha os olhos e fica feliz em
ver a Maitê Proença nua. Uma parte dessa ideia é real (a Maitê existe mesmo) e
a outra é pura fantasia ou falta de dados (normalmente a Maitê, ou a Sasha Grey
ou seja lá quem for não costumam dar uma canja ao vivo assim que se abre os
olhos).
E é mais ou menos assim que se
baseia toda a trama dirigida por Joshua Stern: uma ficção. Não se pode culpar o
orçamento pequeno para os padrões hollywoodianos, coisa de 12 milhões de
dólares. É louvável o esforço de fotografia, trilha sonora e mesmo dos
personagens – Ashton Kutcher realmente se parece demais com Steve em todas as
fases da vida e Josh Gad transpira a simpatia do ainda vivo Steve Wozniak,
primeiro parceiro de Jobs. Ainda assim, o longa mais se assemelha a uma palestra
motivacional do que a uma cinebiografia. O objetivo em algumas tomadas é
mostrar mais o espírito negociador do protagonista do que os feitos em si. Sua
capacidade de barganha, manipulação e retórica o tornaria mais invencível num
negócio que um vendedor do quiosque da Chilli Beans; sua habilidade em tomar
dinheiro de amigos, a de destruir projetos de funcionários e de toma-las para
si caso fosse algo inovador o tornariam uma versão moderna do também americano
Thomas Edison.
Foi
Edison, por exemplo, quem comprou uma máquina de projeção francesa e a
patenteou em solo americano, sendo o inventor “moral” do cinema para os
ianques. Um exemplo crasso de roubo intelectual. Até hoje rondam boatos de que
muitas das invenções da empresa da maçã sofreram o mesmo processo, por culpa de
um chefe que era autoritário e que não conseguia ser comandado. Mas essas
cenas, no filme, causam apenas risadas abafadas da plateia.
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À esquerda, Ashton ao lado do Jobs original. Esforço do ator foi notável (Reprodução) |
Logo,
o que parece ficar do filme são as lições de moral, as frases de efeito de Jobs
que você pode ler em qualquer página de frases do Facebook – ou na próxima
edição da Você S/A. A fantasia alcança o auge da disparidade em três momentos:
Bill Gates, grande nêmese da turma de Cupertino, é citado em apenas uma
discussão por telefone, sem aparecer ou ter uma voz (e o nome Microsoft apenas pisca na tela por uma
fração de segundo). O filme oculta, por exemplo, os embates e encontros
históricos de ambos, ou que a empresa de Gates comprou 40% das ações da rival
para que Jobs voltasse ao cargo de chefe em 1996.
A
segunda é a relação de Steve com sua filha, Lisa Brennan-Jobs. A fantasia aqui
é tão descabida quanto imaginar uma vovó vestida de Tiazinha. O caso quase
destruiu a carreira do empresário e o tirou do sério de uma maneira
descomunal. Mas no filme a reação dele, apesar de explosiva, é mais moderada do
que a demonstrada contra o chefe de acionistas da empresa. E olha que o chefe
nem filho seu era...
A
terceira passou aos meus olhos num momento de distração: ao mostrar como o CEO
da Apple se uniu ao grupo que criaria o célebre Macintosh, no início de 1984,
uma cena de um ou dois segundos é a síntese do filme todo: Jobs explica a um
grupo de funcionários como sua ideia pode revolucionar o universo (ideia que
ele repete de diferentes formas durante toda a história) sentado debaixo de uma
árvore, vestido de branco, com todos sentados ao redor. Um sermão. Debaixo de
uma árvore. Sobre como mudar o universo. Ou seja: Jobs é, sem dúvida, Jesus.
Por
essas e outras o filme, com seus despautérios todos, me lembra a boa e velha
punheta: 90% dele tenta te motivar; é baseado em ideias que em parte são
válidas e, em outras, pura quimera. Não considerem o filme como um bom retrato
do dito “inovador do século vinte e um”. Para isso existem tentativas melhores,
como a biografia de Walter Isaacson ou mesmo o clássico filme Piratas do Vale do Silício, produzido em
1999 e facilmente encontrado para download. Mais preciso em fatos e com mais
lados da história, Piratas entra
melhor no clima informático da coisa, e não a dramatização que serve apenas
para agradar os apple-maníacos, a religião mais chata e esnobe a pisar na face
da Terra.
Mas
sim, há uma diferença entre ambos: masturbação é muito bom.
Abraços.
(Drama, EUA, 2013, 127 min.)
Direção: Joshua Stern
Avaliação: ruim
Por: Guilherme Mendes
De: Carapicuíba - SP
Email: guilherme@revistafriday.com
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